Prof. J. Vasconcelos (membro da ADDP)
ELEIÇÕES SÃO ESSENCIAIS À DEMOCRACIA?
Comecemos então por sua definição. Eleições são processos pelos quais pessoas escolhem candidatos ou assuntos.
Nas democracias da Antiguidade não havia eleições. As pessoas indicadas a ocupar a administração máxima da comunidade e as funções de juízes, eram auto-habilitadas e sorteadas. A Sociedade solicitava aos cidadãos que se candidatassem aos cargos oferecidos; aqueles que se julgassem aptos a exercer as funções se auto habilitavam; havendo mais cidadãos auto-habilitados do que as vagas disponíveis, se procedia ao sorteio.
As eleições propriamente ditas foram invenção da oligarquia romana, as quais se processavam para escolha dos cônsules, funções máximas da administração e do comando militar. A propósito, em todas essas eleições vigoravam esquemas demagógicos e de marketing.
Os estudiosos da Democracia Pura recomendam que eleições devem ser analisadas cientificamente. Numa primeira acepção, observa-se que é o momento em que os cidadãos declaram o SIM ou o NÃO sobre um candidato.
O cientista russo Ivan Pavlov, ao estudar a fisiologia do sistema gastrointestinal, fez uma das grandes descobertas da atualidade: o reflexo condicionado. Pavlov revelou que o reflexo condicionado seria uma resposta psicofísica que não ocorre naturalmente, mas que pode ser obtida pela associação regular de alguma função fisiológica com um estímulo externo (por exemplo: som, luz, odor, etc.)
De modo semelhante, o reflexo condicionado atua sobre os cidadãos no processo de eleições. A apresentação, ou a imagem, ou o comportamento, materializado pela reação emocional, quer pela voz, por um gesto, ou por outra qualquer expressão do objeto da eleição, se traduz num estímulo condicionante. Cada ser humano retém uma predisposição a eclodir sentimentos de variadas naturezas: vinculação paternal, solidariedade, repulsa, ódio, caridade, etc.
A forma como a apresentação é construída e projetada, isso atinge um dos sentimentos predispostos e automaticamente a reação do indivíduo é formalizada de acordo com o sentimento provocado. A propaganda, por exemplo, ou algo similar sobre o objeto (candidato) produz um visual que se transforma num estímulo capaz de acionar um sentimento compatível do cidadão. De sorte que, se a imagem representa alguma coisa indigesta, desprezível ou agressiva, o estímulo condiciona um sentimento de rejeição.
Detalhemos na prática os passos desse processo: o objeto (candidato) constrói, através de uma atitude, ou pela propaganda, uma determinada imagem, que denominamos como “apresentação” perante o público. As pessoas concebem no objeto a imagem apresentada; automaticamente, essa apresentação estimula um específico sentimento. A reação do indivíduo em face do objeto será então de acordo com o sentimento provocado.
Em virtude, portanto, de a eleição se basear na extração de sentimentos, detecta-se um sério problema quando estamos a considerar escolha de candidatos ou análise de propostas complexas.
Dessa forma, torna-se a eleição vulnerável à ação de objetivos demagógicos, que fatalmente envolvem as pessoas a ponto de dirigi-las a atitudes pré-concebidas. Vejamos alguns exemplos. Se um candidato se apresenta ao público acariciando criancinhas, a sua imagem associa-se ao amor maternal e nesse contexto, a reação das pessoas será concernente a esse sentimento. Se, por outro lado, se mostra alvo de ataques de inimigos poderosos, a imagem será de uma vítima da injustiça, extraindo-se, assim, o sentimento de solidariedade ou de caridade.
Em termos conclusivos, a eleição se torna, em algumas situações, um processo perigoso e irracional.
Este foi o motivo por que os estudiosos da Democracia Pura envidaram esforços em pesquisas visando encontrar uma solução racional. Por fim, após longos estudos, descobriram um método racional que descarta qualquer conotação com sentimentos. Daí surgiu o SHP – Sistema de habilitação e de Pontuação, que é um processo de referência matemática com a eliminação do recurso aos sentimentos.
A conclusão final foi que na democracia a eleição deve ser utilizada apenas quando houver necessidade de se resolver um assunto com a extração de sentimentos. Então seriam os casos em que se resolve sobre arte, beleza, culinária, cor, número, modalidades, partitura musical, etc., pois nesses casos o que atua no cérebro das pessoas são os sentimentos. Se se deseja saber do povo, qual a melhor arquitetura para uma representação histórica, pode ser usada a eleição. E assim se aplicaria para se decidir sobre a melhor cor de uma bandeira, o melhor prato regional, etc.
Mas quando se refere a escolha de candidatos ou de propostas complexas, a eleição deve ser relegada e em seu lugar a adoção do SHP e do sorteio.
Sobre o Professor J. Vasconcelos
J. Vasconcelos é professor, filósofo, pesquisador e publicista; pós-graduado em Direito Constitucional, Socialismo e Democracia, em Hamburgo, Alemanha, com cursos na Sorbonne, Paris, sobre História Natural do Homem. Tem desenvolvido pesquisas sobre a produção de ideias em prosseguimento aos estudos de Locke e Stuart, promovido cursos e proferido palestras em universidades de todo o país. É autor dos livros Democracia no terceiro milênio e Democracia Pura, que está na nona edição.
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